Acabo de ler o livro Outra espiritualidade do teólogo e pastor Ed René Kivitz. Nele, Kivitz tece algumas críticas aos conceitos de cristianismo, igreja, céu e fé apresentados equivocadamente pela Igreja Evangélica Brasileira. Assim, Ed René fala de um outro cristianismo, de uma outra igreja, de um outro céu e de uma outra fé propostos pelo evangelho da graça de Deus.
Diante de muitos equívocos construídos ao longo da nossa História como evangélicos, Ed René afirma - na quinta parte do livro, ao falar sobre o estreitamento proposto por Jesus no caminho -, que a subcultura evangélica consegue propor um caminho mais estreito do que deveria. Ele exemplifica mostrando como se dá o relacionamento do evangélico com a arte: desconhece os poetas, não ler romance, divide a arte em profana e sacra, desvaloriza as biografias, proíbe o cinema, não dança, não frequenta museus, salas de espetáculos e teatro. Confesso que fui vítima deste estreitamento por muito tempo. A igreja com sua perversidade me fazia refletir da seguinte maneira diante de uma arte: "Será que isto agrada à Deus?" "Será que isto é de Deus?" e por aí vai... Minha apreciação pela obra era muitas vezes um verdadeiro caça-blasfêmia, pois qualquer livro, poesia, música ou outra expressão de arte que apresentasse algum tipo de blasfêmia à Deus, não prestava! Mas que bom que mudei! Hoje consigo apreciar e dialogar com todo tipo de arte, com tranquilidade e sem peso, medo ou condenação.
E como não pretendo mais ser prejudicada pela crueldade que faz parte da igreja, aproveito este momento para relatar sobre a riqueza do espetáculo Concerto de Ispinho e Fulô apresentado em minha cidade esta semana, pela Cia do Tijolo de São Paulo. O espetáculo me fez revisitar os textos denunciadores do grande poeta cearense Patativa do Assaré, pois o mesmo baseia-se em sua vida e obra. A poesia engajada de Patativa, reflexões acerca da vida, do amor, das injustiças sociais e do Divino foram as mais fortes expressões deste espetáculo. A platéia se viu envolvida num cenário tipicamente nordestino, participando da encenação, dançando, ouvindo de pertinho as poesias, as músicas e experimentando cajuína, café e cachaça. Em toda esta dinâmica, pude perceber que ao contrário da igreja, o ético e o estético divino compõem a poesia de Patativa e ela não deixa de representar Fé, graça e resistência propostos por Ed René no subtítulo do livro, pois o vento sopra onde quer. Pena que muita gente não se atenta à isto.