terça-feira, 25 de outubro de 2011

Carlinhos e a escola amarela

Todos os dias às cinco horas da manhã Carlinhos sai de casa acompanhado de Creuza, sua mãe, que o deixa na porta da escola vermelha esperando abri-la. É muito cedo, o horário é de verão e a madrugada ainda é bastante escura. Creuza trabalha numa cozinha de uma luxuosa casa no condomínio Morada dos ricos e acorda cedo porque a caminhada até o condomínio é longa.

A escola onde Carlinhos estuda está situada entre o bairro São Luíz e o centro da cidade de Jequié. Ela é de pequeno porte mas, atende muitas crianças moradoras de bairros periféricos.

Carlinhos é um menino esperto e enquanto espera a chegada do porteiro da escola, se mantém atento para que ninguém lhe faça mal. Certo dia, resolveu caminhar um pouco, a fim de quebrar a monotonia da espera, e percebeu que próximo à escola vermelha numa distância de mais ou menos dez metros existe uma outra escola bastante diferente. Ela é pintada de um amarelo forte e possui grandes prédios que ameaçam invadir todo o quarteirão.

O encantamento foi a primeira reação de Carlinhos diante da descoberta, logo depois surgiram-lhes grandes questionamentos. Não entendia porque havia tanta diferença entre as escolas e porque era impedido de estudar ali. Pensou: “Não deve ser ruim estudar numa escola grande, com área de lazer, janelas de vidro e ar condicionados”. Ele admirou tanto aquela escola que se esqueceu do tempo. Por isso pôde ver chegar as crianças que estudavam lá. Seus pais as levavam de carro e mais uma vez pensou: “Porque meus pais não tem um carro para também me trazer na escola?”. A cada criança que chegava Carlinhos se convencia mais da diferença que havia entre os alunos da escola amarela e os da escola vermelha. A pele que aparentava a boa alimentação e os tênis de marca e sem furos daquelas crianças traziam à sua memória a figura dos colegas que muitas vezes chegavam à escola sem se alimentar e usavam tênis furados ou chinelos velhos. O garoto se encantou com o cuidado que aquela escola demonstrava ter com seus alunos. Presenciou o momento em que a rua foi interditada para que eles atravessassem de um lado para o outro com toda a segurança. A presença de um policial militar em frente à escola garantindo a segurança do local também o deixou bastante encantado. Então pensou: “Se esta escola tem um policial porque a minha também não pode ter?”. Carlinhos resolveu perguntar ao polícia se ele poderia fazer a segurança da sua escola também. O policial ao vê-lo se aproximando, com seu traje de menino de escola pública, ordenou de forma brutal e ignorante que o mesmo deixasse o local, como se o menino representasse alguma ameaça ao ambiente. Então, o garoto obedeceu prontamente se direcionando à sua escola e ao mesmo tempo voltando os olhos à amarela. Na escola vermelha as aulas já haviam terminado e as crianças saiam levando um saco de leite para casa. E na rua da escola amarela os carros dos pais já formavam fila, na espera dos filhos e atrapalhava os transeuntes.

Foi assim que Carlinhos percebeu que no mundo existem coisas que não deveriam ser diferentes umas das outras, mas são, inclusive as instituições que chamamos de escolas.

5 comentários:

  1. Carlinhos ainda vai descobrir tanta desigualdades neste país capitalista....
    amo td que vc escreve.

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  2. O texto aponta um verdadeiro retrato das desigualdades sociais e enquanto lia visualizava tantas escolas vermelhas e amarelas espalhadas pelo o nosso Brasil.Quero pensar que assim como a autora teve esse olhar sensível, os nossos governantes um dias também tenham.O texto é muito bom, parabéns GAl.

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  3. Lindo texto, Gal. Fiquei imaginando o olhar de Carlinhos o tempo inteiro. Um olhar ingênuo, mas maduro. Um olha de indignação e incomodo. Parabéns pelo texto!

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  4. O que me preocupa é como será formada a mente de Carlinhos... o de aceitar opressão e a desigualdade, ou a de revolta e descontentamento, lutando por uma sociedade mais justa...
    é realmente um caso para refletir , como será q se forma a mentalidade dessas crianças?

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  5. É amiga... é pra refletir msm...essa formação crítica na mente dessas crianças dependerá de muita coisa, inclusive dos professores que passarão pela vida delas.
    Vc enquanto educadora já sabe o que irá oferecer aos seus acrlinhos, conformismo ou luta?
    A mentalidade do Carlinhos do conto será revelado, aguarde os próximos!!!

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