sexta-feira, 18 de setembro de 2015

Entre a Carlos e a Sete, um pedido: Homens negros, amem suas pretas!!!


Estava eu, hoje, chegando na rua Carlos Gomes, na cidade de Salvador, quando de repente passo por duas mulheres NEGRAS, de jeito simples e cheias de criticidade sobre a vida. Foi inevitável não ouvir a conversa entre elas. Uma contava para a outra: "eu perguntei a ele se era racismo ou o quê esse negócio dele namorar apenas mulheres brancas... Pra mim é racismo o cara ficar só com mulheres brancas..." A partir da narrativa da mulher, percebi que a resposta do homem foi bem vazia e sem desconfiança alguma sobre sua situação: "não é racismo não é que gosto mais de namorar mulheres brancas...", enquanto que o questionamento dela tinha no ar, cheiro de porquês e de desconfianças sobre a situação masculina, e sobre a condição de muitas mulheres negras do nosso Brasil. Mesmo sem ela entrar em detalhes, a indignação da mulher me deu uma pista: o homem da narrativa, com certeza, é negro! Ao ouvir esta conversa lembrei do que disse uma professora minha: "os homens negros não foram ensinados a amar as mulheres negras". Tive vontade de dizer isso para elas, mas concluí que não era preciso, pois elas já sabem disso. Quando olhei para trás, elas atravessavam a rua e seguiam para a Avenida Sete, certamente prontas e empoderadas para enfrentar o racismo nosso de cada dia, que tenta nos negar até mesmo o amor. Adoro quando vejo teoria crítica implícita na boca e na vida do povo, que sabe o que sente.



sábado, 12 de setembro de 2015

Conceição


Certo dia, minha mãe me disse:
- Menina, você nasceu pra casar e gerar!

Certo dia, a religião me disse:
- Seu corpo está aí pra negar!

Certo dia, meu irmão mais velho me ordenou:
- Menina, saia daqui! Este não é seu lugar!

Certo dia, eu tive um homem que se apropriou de mim:
- Não vista esta roupa! Não use este batom!
- Você quer se parecer com uma puta?
Certo dia, o pastor me disse do púlpito:

- Sua roupa não é de moça decente, crente!
Certo dia, a igreja me expulsou porque
 “pequei”, “desantifiquei”!

Certo dia, meu pai gritou:
- Preferia te ver morta que assim: grávida!

Queimei!

Todos os dias, o sistema me nega tudo.
E assim, recebo outros talhos.
Mas, mesmo entre olhares tortos,
não me resvalo.

Me ponho, em punho:
sou negra e mãe solteira!

  

quinta-feira, 19 de março de 2015

Todo conhecimento é autoconhecimento

SANTOS, Boaventura. Um discurso sobre as ciências. 7. ed. São Paulo: Cortez, 2010.

Por Glauce Souza Santos
Resumo:

A terceira tese apresentada por Boaventura de Sousa Santos no que se refere ao paradigma emergente na ciência é a de que todo conhecimento é autoconhecimento. Boaventura inicia esta discussão fazendo um retrospecto de como na Ciência moderna o conhecimento objetivo foi a base para a construção da distinção dicotômica SUJEITO/OBJETO. Afirma que a passividade da distinção SUJEITO/OBJETO nas Ciências naturais gerou um atraso nas Ciências sociais. Por isso foi necessário que houvesse uma articulação metodológica entre a distinção epistemológica entre sujeito/objeto com a distância empírica entre sujeito/objeto. A Antropologia e a Sociologia evidenciaram isto. Na Antropologia a distinção sujeito/objeto aceitou ou exigiu que a distância fosse relativamente encurtada através de metodologias que obrigavam uma maior intimidade com o objeto, trabalho de campo etnográfico. Na Sociologia, a distinção epistemológica obrigou que esta distância fosse aumentada por meio de metodologias de distanciamento. As vibrações destes movimentos vieram a explodir no período pós-estruturalista. Foram a Antropologia e a Sociologia que questionaram o status quo (estado atual) motodológico e as noções de distância social em que ele assentava. Nas Ciências sociais há o regresso do sujeito demonstrado na física quântica, que o ato de conhecimento e o produto do conhecimento eram inseparáveis. O aprofundamento do conhecimento segundo a matriz materialista desembocou num conhecimento idealista.  A nova dignidade da Natureza mais se consolidou quando se verificou que o desenvolvimento tecnológico desordenado nos tinha separado da natureza em vez de nos unir a ela. Assim, o desconforto da distinção sujeito/objeto que sempre houve nas Ciências sociais propagava-se para as Ciências naturais. Nas palavras do sociólogo, o sujeito regressava na veste do objeto.
Boaventura aponta a partir dos conceitos de mente imanente, mente mais ampla e mente coletiva de Bateson que Deus (foragido da Ciência moderna) pode regressar, mas de uma forma transfigurada, onde não há nada de divino, senão o nosso desejo de harmonia e comunhão com tudo o que nos rodeia. Segundo ele, um novo conhecimento (gnose) está em gestação. O sociólogo justifica sua posição de que todo conhecimento é autoconhecimento afirmando que “O objeto é a continuação do sujeito por outros meios.”
Para Boaventura, a ciência moderna não é a única explicação possível da realidade e esta não é melhor que as explicações alternativas da metafísica, da astrologia, da religião, da arte ou da poesia. Ainda chama atenção para o privilégio de uma forma de conhecimento assente na previsão e no controle dos fenômenos que segundo ele, nada tem de científico, é apenas um juízo de valor e de que a explicação científica dos fenômenos opera como autojustificação da Ciência enquanto fenômeno central da nossa contemporaneidade. Sendo assim, afirma: a ciência é autobiográfica. As nossas trajetórias pessoais e coletivas (os valores, as crenças e os prejuízos que transportam) são de certa forma a prova íntima do nosso conhecimento. Este saber corre hoje subterraneamente, clandestinamente nos não-ditos dos nossos trabalhos científicos.
Boaventura assegura que no paradigma emergente, o seu caráter autobiográfico e auto-referenciável da ciência é plenamente assumido. Relembra que a Ciência moderna deixou como legado um conhecimento funcional do mundo que alargou extraordinariamente as nossas perspectivas de sobrevivência, fazendo enxergar não tanto o sobreviver, mas o saber viver, pensando numa outra forma de conhecimento (compreensivo e íntimo) que nos una pessoalmente ao que estudamos.
Por fim, Boaventura pontua o fato da Ciência do paradigma emergente ser mais contemplativa do que ativa e a qualidade do conhecimento aferir-se muito mais pela satisfação pessoal que dá a quem adere e o partilha. No que se refere a dimensão estética da ciência, pontua também que esta tem sido reconhecida por cientistas e filósofos da ciência. Há também, na criação científica no paradigma emergente, uma proximidade assumida, da criação literária ou artística. Assim, o discurso científico se aproxima cada vez mais do discurso da crítica literária subvertendo a relação sujeito/objeto que o modelo emergente deseja operar. A ressubjetividade, o conhecimento científico ensina a viver e traduz-se num saber prático, quarta característica da ciência pós-moderna.


terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

Cãofajeste



Por Glauce Souza
Dedico este texto à Adriana Ichim

Hoje eu estava pensando sobre a grande quantidade de cafajestes que existem no mundo e cheguei à conclusão que corre um grande risco quem se relaciona com este tipo de homem. Por isso, imaginei a seguinte sentença: nossa vida amorosa seria muito mais tranquila se cada cafajeste andasse com uma plaquinha no pescoço, tais aquelas que encontramos nas casas onde há cães perigosos. Para um cafajeste bastaria a seguinte frase: “Cuidado! Cãofajeste”. Assim, tenho certeza que muitas pessoas manteriam mais distância desse tipo de homem.
O título do meu texto não surgiu à toa, pois, há muitas semelhanças entre um cão perigoso e um homem cafajeste. Uma delas é o fato de ambos serem, na maioria das vezes, encantadores (em alguns aspectos) e também perigosos. Assim, por uma vida mais feliz, vale à pena darmos um pouco de atenção a essas semelhanças e entendermos que se alguém se ama de verdade, deve nunca se apaixonar por um cafajeste! Muitas pessoas não irão concordar comigo, afirmarão que se apaixonar por um “cafa” vale muito à pena, apesar das lágrimas. Inclusive, já li até um texto, muito bem escrito, sobre isso. A autora concluía seu texto agradecendo o fato dos cafajestes existirem. Ainda não cheguei a esse nível, e sinceramente, não quero nem chegar. O nível máximo que consigo alcançar é ser flexível a ponto de acreditar que o melhor a fazer, quando conhecemos um “cafa” e nos relacionamos com ele, é estabelecer uma relação idêntica àquela que eles estabelecem conosco. Acione o botão da razão e responda: se um cafajeste nunca se apaixona, porque eu irei me apaixonar por um deles? Em nome de uma vida sem decepções, há muito que fazer, como aproveitar o “cafa” da mesma forma como eles tentam se aproveitar de nós. Se assim desejar, coloque cada coisa em seu lugar, viva o momento e seja feliz. Aliás, o carpe diem é uma das melhores marcas de um cafajeste, se aproprie também do termo! Aproveite o seu corpo disponível, o bom papo, a sua cortesia, aprenda com sua inteligência e simplicidade, usufrua da sua poesia, música, pintura (muitos deles são talentosos), deguste seus pratos maravilhosos e o vinho que certamente irá te oferecer. Faça tudo isso, mas não esqueça que você está diante de um CAFAJESTE. Se fizer diferente, você correrá grandes riscos de sofrimento. Do sexo ao vinho, tudo isso pode ser muito bom.  
Outro dia descobri mais uma característica dos cafajestes de plantão: todos eles desejam se tornar um deus, do sexo. Por armazenar muita cafajestagem em seu DNA, conseguem conquistar, sem muito esforço, vários adoradores. São alternativos, educados e sensíveis. Quem tem coragem de administrar uma empreitada dessas? Deus me livre!!!
Apesar de tudo, tenho medo dos cafajestes, e à medida que posso, mantenho certa distância deles, pois assim como o cão bravo, se você vacilar eles te arrancam um pedaço.

quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

Vítimas de ontem, vítimas de hoje



Hoje ao ligar a TV vi que um incêndio havia acontecido em determinado lugar em Salvador, o jornal que dava a notícia estava terminando, logo desconfiei de que as vítimas mais uma vez eram aquelas pessoas de sempre, os menos favorecidos... Era meio dia quando fui ver a notícia na integra, e vi que minha desconfiança já não era desconfiança, tornara-se certeza! O incêndio havia destruído palafitas de Alagados em Salvador, o fogo começou as 00:30 e e as chamas foram debeladas as 04:40. Muitas pessoas, agora, estão desoladas! Muitas delas sofrem com a longa espera pela casa prometida por programas dos governos. Chorei ao ver a reportagem e imediatamente me lembrei desse clipe gravado no final da década de 80 que retrata a vida desse povo sugado. Vejam como, infelizmente, o vídeo clip é atual, isso porque a injustiça social é sempre atual! "Todo ano isso ocorre. É sempre o mesmo corre-corre
Todo ano a hipocrisia/Faz parte dessa agonia/Demagogos, oportunistas

Vejam as vítimas/De toda a inoperância/Da brutal ganância(...)"
Embora ninguém tenha morrido, fiquei muito triste com a notícia, pois muitas famílias ficaram desoladas.

"Nasci no fim do mundo
Vivo no fim do mundo
Aqui nesse fim de mundo
Vivo como um condenado
Pois nada sobrou pra mim
Quando as casas caem
Sinto-me triste demais
(...)"
Ah... Salvador "Bela cidade...", lamento a injustiça estampada em ti!