Semana passada vi a seguinte notícia no facebook: "Mulheres com instrução maior ficam mais solteiras". Fonte: Jornal Metro Brasil, 12 de janeiro de 2012.
Imediatamente lembrei deste texto do professor Marcos Aurélio Souza¹. Gosto muito desta reflexão e estava esperando um momento devido e a autorização do autor para publicá-la. Recebi a autorização e o momento de publicar o texto chegou, pois, ele pretende responder sobre o fenômeno da solterisse feminina. O autor não atribui este fato somente ao status educacional que as mulheres estão adquirindo, como propõe a notícia do facebook, mas, à cautela e um cuidado inteligente de si. Dedico este post à Adriana Barbosa e Luanna Rodrigues. Boa leitura!!!
"La mujer no es solamente un
instrumento de conocimiento, sino el conocimiento mismo,
el conocimiento que no poseeremos
nunca, la suma de nuestra definitiva ignorancia:
el misterio supremo". (Ruben Dario)
Há muito estou querendo escrever um texto para (e sobre) as mulheres.
E hoje, ouvindo a letra de um famoso pagode muito tocado aqui em Salvador,
aproveitei um trecho como mote, criei o título e comecei a escrever. Ainda
que muitos desses pagodeiros sejam machistas e só enxerguem a mulher como
bunda, vagina, pernas e peitos, há sempre algo que se possa aproveitar. É
mesmo possível inverter tudo o que se possa ridicularizar uma mulher nessa
cidade, porque simplesmente elas estão "dominando o pedaço".
A despeito de uma pesquisa que foi divulgada, indicando Salvador como
a cidade com o maior número de “mulheres sozinhas” do Brasil (tal pesquisa
apesar de apontar o número de homens, enfatizava o número das mulheres, como
no destaque da Revista Veja: http://veja.abril.com.br/270405/p_126.html) há algo
imponentemente feminino nessa cidade, que certamente machos desocupados não
se interessariam em pesquisar. É impossível não notar uma presença muito significativa
das mulheres onde quer que você vá em Salvador, até em profissões
tradicionalmente masculinas, como taxistas, motoristas de ônibus, cobradoras,
policiais etc. As “mães solteiras” por opção e não apenas por falta de, e as
chefas de casas estão em maior número também. Isso não resulta apenas
da chamada revolução feminina, de uma demanda do mercado ou duma vantagem
numérica (como a revista insinua) isso é, sobretudo, uma mudança
paradigmática, que nós homens (e também algumas mulheres) precisamos tentar
entender e assimilar rapidamente pra não ficar fazendo e falando besteira. Eu
acho que a idéia mais importante na conclusão da pesquisa dirigida pela
FGV (Fundação Getúlio Vargas) não deveria ser "quanto mais a mulher
amadurece, menos chances tem de encontrar um parceiro", mas: quanto mais
a mulher amadurece, mais criteriosa e esperta ela fica em relação a escolha
de um parceiro. E isso não é apenas uma exigência dela, porque estão
adquirindo elevado status econômico e educacional e querem isso dos seus
parceiros, mas uma estratégia de cautela e um cuidado inteligente de si.
A vida de qualquer homem depende muito e cada vez mais das mulheres
aqui em Salvador, e eu aposto ser uma realidade também em outros cantos do
mundo. Temos cada vez mais mulheres decidindo a nossa vida, o nosso emprego,
a nossa satisfação emocional e material. A solidão das mulheres, no caso das
heterossexuais (eu ainda quero saber por que não deram igual importância ao
número de homens solitários, e porque ainda não fizeram uma pesquisa com
homossexuais) pode significar muitas coisas e talvez seja mais preocupante
para os homens heterossexuais, sozinhos ou não, do que para elas mesmas. Há
uma possibilidade enorme de que a maioria dos homens simplesmente não
desperte o menor interesse como companheiro fixo, ou como companheiro
provisório, para a maioria das mulheres (e isso sim é preocupante para nós)
elas porque têm uma consciência maior do que a nossa, a respeito daquele
clichê: “antes só do que mal acompanhada”. Elas certamente já presenciaram
vidas infelizes de mulheres “acompanhadas” em suas próprias famílias,
experiências de amigas, colegas, irmãs, tias que sofreram muito com seus
parceiros/esposos/namorados violentos, machistas, burros e irresponsáveis. Há
também uma necessidade premente de se fazer um recorte racial nessa pesquisa,
o que certamente resultaria numa quantidade bem superior de mulheres negras,
optando por essa “solidão” do que de mulheres brancas. E isso ainda é reflexo
de uma sociedade, onde duas pragas juntas, o racismo e o machismo, contra a
mulher são muito mais devastadoras, sendo uma opção segura a de viver só, do
que com um companheiro abjeto e repugnante.
É também necessário pensar na possibilidade de que mulheres, nessas
circunstâncias, vivam bem a sua sexualidade “solitariamente”, ou até vivam
bem sem uma vida sexual (como alguns poucos homens também vivem) e isso não
seja exatamente um problema ou tenha algo a ver com a falta de
“pretendentes”, ou mesmo com a idéia de uma “solidão” (em nossa cultura
machista, sempre relacionada à impotência e a carência femininas). As
mulheres estatisticamente também podem estar preferindo uma vida amorosa (no
sentido de sexo, inclusive) mais casual, sem compromisso, e isso é
provavelmente uma boa forma de vivê-la nesse mundo.
Elas, nesse sentido, certamente estão aprendendo mais com a história
do que nós homens. E quando eu ouvia o pagode cuja letra procurava expressar
um corpo feminino no gesto sensual de “perereca pra frente, perereca pra
trás” (uma daquelas metáforas para o órgão sexual feminino), eu fiquei
imaginando um corpo e uma mente femininas que também expressavam: “tudo bem,
mas 'sai fora', porque eu não sou pra qualquer um”.
_______________________
¹ Marcos Aurélio é Professor de Literatura Brasileira da UESB, campus de Jequié. Doutor pela Universidade Federal da Bahia. * Acedido no Blog: http://aurelio-souza.zip.net/ |
terça-feira, 24 de janeiro de 2012
Mulher madura não é pra qualquer um
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Embevecido pela sua lembrança, o texto é um dos mais antigos meus, sua leitura traz pra ele um frescor e me impulsiona a querer aprender e escrever mais sobre o tema, dialogando com a produção de mulheres inteligentes e articuladas como você Adriana Abreu, Ana Cláudia Pacheco e outras... Excelente lembrança Paula Santos, nao sei o que seria de mim sem as mulheres que me cercam, como diz Adélia Prado, no poema que vc lembrou: "ser coxo na vida é maldição para homem". Vocês me ajudam a caminhar.
ResponderExcluirAmiga...estou super feliz com a dedicatória...o texto é realmente incrível, jáo o conhecia. É a emancipação das mulheres se dá nos diversos aspectos da vida, e somente mulheres emancipadas conseguem lhe dar com essa tal "solteirisse" pq o bordão não nos deixa enganar: "antes só do q mal acompanhada". Bjo nega!!!
ResponderExcluirLuanna Rodrigues
PERFEITO!! E é isso...Sem mais!!
ResponderExcluirParabenizo o autor pela lúcida e inquietante produção!
Não me surpreende..como muitas de nós vai desejar ter um parceiro se o predomina na nosa sociedade é nossa degradação? A objetificação da mulher tem esses efeitos em nós,a gente fica sem vontade( não consegui pensar em palavra melhor) de ter um homem ao lado porque aimpressão que dá é que todos nos vêem como bundas e peitos,e a qualquer hora,vai pular fora atrás de uma "outra bunda maior e /ou mais nova".Em suma: afeta toda a sociedade de forma negativa,apesar do texto sugerir ao contrário e não ir fundo nesta problemática da nosa exploração sexual.
ResponderExcluirMulheres emocionalmente independentes!
ResponderExcluirAmei o texto Parabéns!