domingo, 8 de janeiro de 2012

Bonhoeffer, uma canção que marca




Certo dia entrei em uma livraria evangélica da minha cidade à procura de algum livro interessante para comprar. Gosto de ler alguns escritores cristãos e me dedico a um estudo amador da teologia. Neste dia, meus olhos viram um livro que trazia em sua capa uma fotografia acinzentada do rosto de um homem desconhecido para mim. Era o pastor e teólogo alemão Dietrich Bonhoeffer (1906-1945) que havia sido enforcado pelo regime nazista por participar de uma conspiração para matar Hitler. Ao ler estas informações no fundo do livro, decidi comprá-lo. A obra intitulada Bonhoeffer, o Mártir (Responsabilidade social e compromisso cristão moderno) foi escrito por Craig Slane e possui uma escrita de caráter acadêmica bastante refinada o que me fez lê-la demoradamente.
Neste livro, é abordada a seguinte questão em relação à Bonhoeffer: É possível chamá-lo legitimamente de mártir cristão? Para responder esta pergunta Slane explora os conceitos de martírios no cristianismo primitivo e de que forma a vida cristocêntrica e socialmente responsável deste teólogo corresponde a esta definição.
Meu encanto com a vida de Bonhoeffer me levou a encontrar também uma obra cinematográfica dedicada a ele. O filme intitulado Bonhoeffer, o agente da graça nos leva a perceber como ele se posicionou diante do nazismo de Hitler na Alemanha, durante a II Guerra Mundial. É possível identificar que este pastor rompeu com parte de sua religiosidade e desenvolveu um novo pensamento teológico motivado pela conjuntura de um mundo em Guerra. Afirmou ele: “Ser mal é pior do que fazer o mal”, “É melhor um amante da verdade contar uma mentira do que um mentiroso dizer uma verdade”, “Fugir do pecado pode ser a culpa máxima”.
O filme registra o desejo de Bonhoeffer em conhecer, conviver e aprender com o líder Mahatma Gandhi, o primeiro a organizar uma campanha de desobediência civil por toda a Índia. É assim, que proibido de falar em público, ensinar e publicar seus pensamentos, Bonhoeffer alerta corajosamente sobre o perigo das leis ligadas ao nazismo. Segundo ele, elas significavam uma agressão contra o próprio cristianismo e uma exigência que um cristão somente poderia aceitar, caso viesse do próprio Cristo. 
   No filme há uma cena, a qual considero emblemática. Nela os nazistas entram no seminário, o qual Bonhoeffer ensinava, e destroem cadeiras, mesas e tudo que há ali. Para marcar a presença deles, aproveitam o desenho da cruz na parede e a transformam no símbolo nazista. A contribuição do desenho da cruz para o símbolo, representa nada mais nada menos que a própria contribuição que foi dada por pastores considerados cristãos a um governo tirânico nesta época.
Bonhoeffer tinha a consciência de que no futuro o mundo precisaria de uma nova forma de cristianismo. Para ele, havia somente um propósito para a religião no mundo moderno onde as pessoas viriam e compartilhariam do sofrimento dos outros e do sofrimento de Deus num mundo sem Deus. E é dentro de uma igreja destruída, com uma cruz caída, e a imagem do Cristo rasurada, no caminho de Flossenburg, que Bonhoeffer professa as seguintes palavras:

“Eu estive pensando o que Cristo irá significar no futuro. Vamos precisar de uma nova forma de cristianismo à medida que o mundo envelhece. Acho que só há um propósito para a religião no mundo moderno onde as pessoas virão e compartilharão do sofrimento dos outros e compartilharão do sofrimento de Deus num mundo sem Deus. Precisamos mais do que apenas religião no sentido formal. Precisamos de fé e de Jesus Cristo em seu ponto central. O verdadeiro cristianismo significa compartilhar a dor do outro. Não nos cabe profetizar o dia em que mais uma vez o homem irá pedir a Deus para que o mundo seja modificado e renovado. Mas, quando chegar esse dia haverá uma nova linguagem talvez até um pouco religiosa mas libertadora e redentora como foi a linguagem de Jesus. Irá chocar as pessoas com o seu poder, será a linguagem da nova verdade proclamando a paz de Deus junto aos homens”.
O filme mostra como Bonhoeffer enfrentou a morte. O tremor do seu corpo, admitiu ele, não era de medo, mas, do próprio frio que inundava seu corpo nu que caminhava em direção ao local reservado à sua execução. Somente alguém que vive o verdadeiro cristianismo consegue demonstrar coragem, ter esperança e acreditar que mesmo diante da morte ainda não é o fim.
No prefácio do livro Craig Slane compara a história de Bonhoeffer como aquela canção que ouvimos no rádio e não conseguimos tirar da cabeça. Foi exatamente isso que aconteceu comigo e continuará acontecendo com todos aqueles que conhecerem a história deste mártir. Embora não sejam divulgadas como deveriam, sua vida e sua teologia engajada são exemplos a seguir.
Depois de ler e assistir ao filme, não me resta dúvida de que Bonhoeffer deve ser considerado um mártir cristão, pois o mesmo vivenciou o evangelho genuíno de Cristo e em momento algum fugiu daquilo para o qual foi chamado.

4 comentários:

  1. Bela resenha, senti vontade de ler o livro e conhecer a vida desse pastor engajado. A ideia de uma religião que acompanhe os movimentos históricos do mundo é uma chave do seu pensamento, traz uma reviravolta naquela percepção estática da moral e da bondade cristã, que parece uma falácia pois não acompanha as circunstancias políticas e históricas.

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  2. É verdade Marcos, o que mais me encanta neste teologo é o fato dele ter acompanhado as circunstâncias políticas e históricas e se posicionado de acordo aquilo que acreditava.

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  3. Eu te achei pelo F5 Gal e percebi o quanto perdi em não ler teus posts antes, o blog está lindo e o conteúdo de excelência, parabéns minha cara!

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    1. Olá Carlo Said seja bem vindo ao Varias partes de mim. E sobre o F5 estarei escrevendo de 15 em 15 dias lá. Grande Abraço!

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